domingo, 30 de janeiro de 2011

Os refúgios do Poeta III

A última postagem sobre as casas de Pablo Neruda é sobre La Sebastiana:

Em 1959, cansado do agito de Santiago, Neruda buscou um refúgio na cidade litorânea de Valparaíso. Sua nova residência deveria atender a alguns requisitos: não estar num lugar nem muito alto nem muito baixo; deveria ser solitária, mas não em excesso; vizinhos, se possível, invisíveis; independente, mas próxima de comércios; nem grande nem pequena, e barata. Em uma das ladeiras da cidade, encontrou a casa perfeita, construída por um espanhol chamado Sebastián Collado, que morreu sem terminar a obra. Neruda a concluiu e batizou La Sebastiana.

Durante a visita, uma cena engraçada: o passeio não tem guias. Turistas latinos, europeus e orientais carregam aparelhos cheios de botões parecidos com celulares perto ao ouvido para escutar, em inglês ou espanhol, as explicações gravadas. Os visitantes podem conhecer os ambientes aleatoriamente, gerando um agitado movimento por toda a casa ao mesmo tempo em que o silêncio impera no local.

Dos cinco andares, o escritor habitou os de cima, enquanto um casal de amigos ficou com os junto ao solo. A divisão foi estratégica: Neruda não podia ficar longe de sua paixão, o Pacífico. Da sala de estar, é possível ver a magnitude do mar, que sempre o inspirou:

“O Oceano Pacífico saltava do mapa. Não havia onde colocá-lo. Era tão grande, desordenado e azul, que não cabia em lugar nenhum. Por isso o deixaram em frente à minha janela.”

 Como sempre, capitão Neruda quis uma casa que lembrasse uma embarcação, e assim a fez. Subindo para seu escritório, há pequenas janelas redondas de onde se pode espiar o mar.

Na sala de estar, está La Nube (a nuvem), poltrona que assim nomeou porque era onde gostava de descansar e observar Valparaíso e seus intermináveis morros. Em seu tecido, ainda é possível ver marcas de tinta que caíram enquanto ele escrevia sentado ali. Na sala, outra surpresa: um cavalo de carrossel. O adulto que não deixou de ser criança mandou fazer o piso do chão em formato redondo para dar a impressão que se está sobre o brinquedo.

Na mesa da sala, as louças estão arrumadas como se o dono da casa viesse para o jantar. As taças de vidro têm as mais variadas cores, já que Neruda dizia que isso dava um sabor mais agradável às bebidas. Apenas convidados não bem-vindos eram recebidos com taças transparentes.

Um mistério paira sobre La Sebastiana. O escritor dizia que, à tarde, via pela janela uma vizinha que tomava banho de sol nua na laje de casa. Seus amigos, intrigados com
a história, esperaram para ver a moça, e não a viram. Por vários outros dias, fizeram a mesma tentativa, mas nunca encontraram a mulher, que possivelmente povoava apenas a imaginação do poeta.

O amor por suas casas era tão grande que transpassou a vida. No imenso jardim da moradia de Isla Negra, dois túmulos cobertos por pequenas flores descansam de frente ao mar: Neruda e Matilde. O corpo do escritor havia sido enterrado em Santiago, mas para atender a um pedido registrado em sua obra “Canto General”, foi transladado para lá, onde permanece em seu eterno refúgio.

E a minha palavra nascerá de novo,
talvez noutro tempo sem dores,
sem os fios impuros que enredaram
negras vegetações ao meu canto,
e nas alturas arderá de novo
o meu coração ardente e estrelado.

Nayara D'Alama
Imagens: Viajetrip e Mundo Pequeno

sábado, 22 de janeiro de 2011

Os refúgios do Poeta II

O post de hoje é sobre a casa de Pablo Neruda em Santiago

La Chascona

No sopé do Cerro San Cristobal, o principal morro do centro de Santiago, um ponto turístico passa despercebido pela maioria dos visitantes da cidade. O zoológico, o funicular e a estátua da Virgem presentes no local chamam mais atenção do que a construção que se esconde atrás de um muro pintado com vários desenhos multicoloridos.

 Em 1953, ainda casado com Delia de Carril, o escritor começa a construir uma casa para sua amante Matilde Urrutia, quem o acompanharia pelo resto da vida. A homenagem não deixou a desejar: tem vista direta para a cordilheira dos Andes. Na época, a residência era cortada por um riacho que descia a encosta.

Dois anos mais tarde, o poeta mudou-se para lá e batizou o lar de La Chascona (em português, despenteada), em referência aos volumosos cabelos ruivos da dona da casa. Outras homenagens a esse amor estão disfarçadas pelos ambientes. Na grade de uma janela há ferros em forma de P (Pablo) e M (Matilde), formando um desenho que seria uma meia-lua sobre o mar. Na sala de estar, há um quadro do mexicano Diego Riviera chamado “La Medusa”, onde Matilde aparece pintada com duas cabeças. Um observador mais atento pode ver o perfil de Neruda entre as mechas de seus cabelos.

A criatividade do autor também está presente nessa casa. As habitações são recheadas com os mais excêntricos objetos, que vão desde quadros – alguns deles apenas esboços – até os sempre presentes instrumentos de navegação. No interior de uma televisão sem tela, o poeta guardou objetos de prata, para que o aparelho “tivesse, enfim, alguma serventia”, explica o simpático guia de cabelo comprido.

Por estar em uma colina, La Chascona tem vários níveis conectados por escadas. A sala de estar e o quarto principal estão em um edifício separado do ambiente em que ficam o escritório de Matilde e a sala de jantar. Já a biblioteca está afastada em um plano mais alto do jardim. Talvez para cortar caminhos ou apenas dar um ar mais fantástico à casa, Neruda construiu uma passagem secreta. Atrás de uma parede na sala de jantar, esconde-se uma escada em caracol que sobe até o escritório da mulher amada.

No jardim há duas escadas que, por caminhos diferentes, levam ao mesmo destino: o bar de verão, onde o escritor recepcionava seus convidados nas estações quentes. O que chama atenção aí é a coleção de objetos gigantes, como sapatos e chaves, com uma origem bastante curiosa: eles eram colocados em frente de lojas (chaveiros, por exemplo) para que os clientes analfabetos pudessem localizar os comércios que procuravam.

A casa que nasceu para abrigar seu amor também foi cenário do velório do poeta. Apenas poucos dias após a tomada do governo pelos militares e a morte de seu amigo Salvador Allende, em 1973, o poeta morreu de câncer – versão que até hoje é questionada. Muitos falam que, na verdade, ele, esquerdista convicto, não aguentou ver a difícil situação de seu país e morreu de tristeza. Um duro golpe para o Chile. Depois disso, sua casa foi saqueada e danificada, mas Matilde a reconstruiu.

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Os refúgios do Poeta

Pessoal, como publicado anteriormente, visitamos as três casas que foram de Pablo Neruda e que hoje são abertas à visitação. Escrevi um texto sobre cada uma delas para que vocês possam conhecer o mundo mágico desse escritor que encantou o mundo. Será uma postagem para cada casa. (Observação: não era permitido tirar fotos do interior delas.) Aí vai:

Refúgios do poeta
 
Além das inúmeras obras, mulheres e viagens que rechearam sua agitada vida, Pablo Neruda teve muitas residências – no Chile e no exterior – onde se dedicava a escrever e encontrar-se com amigos. Ao visitar três de suas casas que viraram museus e olhar as paredes com mosaicos coloridos, as coleções dos mais variados objetos e os extravagantes artefatos trazidos de todas as partes do planeta, é possível entrar no mundo desse excêntrico e cativante escritor.

A casa de Isla Negra

A impressão é de estar dentro de um poema. Ao passar pelas portas de entrada, parece que o imaginário poético de Pablo Neruda se materializa. Cada objeto e centímetro quadrado das casas que o abrigaram nas cidades de Isla Negra, Santiago e Valparaíso tem sua própria história e guarda um pouco das memórias do escritor, diplomata e senador.

Em 1937, aos 33 anos, Neruda buscou uma casa onde poderia inspirar-se e dedicar-se à literatura. À beira do oceano azul e das rochas escuras de Las Gaviotas, encontrou o que procurava. Para quem foi batizado como Neftalí Ricardo Reyes Basoalto, não seria difícil também mudar o nome da região para Isla Negra, como é conhecida até hoje.

Diariamente, turistas de todas as partes do mundo peregrinam para o local. No início da visita, uma placa decepciona o grupo de seis coreanos com máquinas digitais a postos: não é permitido fotografar o interior da casa. O jeito é, em um desespero frenético, olhar todos os inúmeros detalhes de cada cômodo para tentar gravar o máximo de informação possível na memória.

A decoração evidencia a paixão que o antigo morador tinha pelo mar. Na sala de visitas, diferentes mascarones – aquelas estátuas que adornam a proa de navios – repousam em frente à janela de vidro. O poeta, em atitude bastante cruel, as teria colocado ali para que olhassem o oceano por onde nunca mais navegariam. As portas baixas e estreitas e o teto arredondado foram desenhados para lembrar o formato de um navio. Diversos objetos marinhos, como bússolas e mapas estelares, decoram os outros ambientes da casa onde o poeta era capitão. Em suas louças havia desenhos de instrumentos de navegação, assim todos saberiam quem mandava ali.

Personagens de amores impossíveis também habitam o local. Na sala de jantar, Neruda pendurou a cabeça de um pirata na parede atrás de seu lugar à mesa e, para que esse tivesse companhia, colocou em sua frente a estátua de uma bela mulher. “O problema é que ela teria se apaixonado pelo mar – visível através da parede de vidro – e nunca olhou para seu admirador”, conta romanticamente o guia moreno de olhos azuis como o oceano para onde aponta com o dedo.

Mesmo aqueles que não conhecem nada sobre Pablo Neruda podem ver nos objetos sua alma curiosa. Ele colecionava tudo: veleiros engarrafados, borboletas, livros, máscaras, conchas, estribos. Entretanto, nunca se considerou um colecionador, e sim um ‘coisista’, já que gostava de juntar coisas. Entre elas, está uma garrafa cheia de areia presenteada pelo amigo brasileiro Jorge Amado.    

Outras excentricidades mostram a mente criativa do dono da casa. No segundo piso, a cama do escritor atravessa o quarto em diagonal para ser possível ter uma visão maior do mar por duas grandes janelas. O escritório onde trabalhava tinha o teto revestido de zinco para ele escutar o barulho da chuva, que o recordava da sua infância no sul do Chile. A mesa em que escrevia é ‘um presente do mar’, já que foi feita com a porta de um navio que as ondas deixaram no quintal de sua casa. Os visitantes também podem ver a estátua de um demônio da Ilha de Páscoa que, segundo superstição, maldiz todos os que olham seus olhos. Neruda dizia não acreditar na lenda, mas, por via das dúvidas, lhe tirou um olho.  

Um cômodo foi construído especialmente para abrigar o ‘cavalo mais feliz do mundo’. A estátua do animal em tamanho real ficava à frente de uma loja de celas e encantou Neruda quando era criança. Anos mais tarde, o escritor comprou a escultura em um leilão e deu uma grande festa para comemorar. Como três convidados levaram rabos de presente e o anfitrião não quis decepcionar ninguém, a estátua sortuda ficou com os três.

Uma placa na parede da sala revela a mania de batizar residências: La Manquel. Esse seria o nome de uma de suas casas na França, cuja origem vem da palavra Manque, que na língua dos indígenas mapuches significa “condor”, ave típica dos Andes. “O poeta adicionou um “l” ao final da palavra apenas para soar mais francesa”, diverte-se o guia.  A casa-museu de Isla Negra é a única que não tem um nome próprio, como as de Santiago e Valparaíso, La Chascona e La Sebastiana, respectivamente.

 O jardim ao redor da casa é igualmente espetacular. O terreno termina na praia, onde há várias rochas e o mar azul que serviram de inspiração ao escritor. Pendurados em uma estrela gigante feita de madeira, estão vários sinos que o poeta tocava quando regressava de viagem para que a vizinhança soubesse que ele havia chegado em casa.


quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Confieso que he vivido

Acho importante um post para marcar o final de nossa ‘vida chilena’. Ele está um pouco atrasado, eu sei, mas depois que você volta é tantas pessoas a ver e coisas a fazer que você deixa algumas coisas de lado. Agora é hora de dizer: eu morei no Chile... e amei.
Os detalhes dos últimos dois dias em Santiago já estão relatados no post na Nay, abaixo. Assim não contarei o que fiz, mas o que senti.
Pessoalmente acho que do trio Lary-Nay-Outro fui a que mais sofreu com o final do intercâmbio. Amei o Chile com todas as forças, seu sul, seu norte, seu litoral, sua capital. Jamais imaginei que este país me surpreenderia tanto e de formas tão distintas.
Havia me acostumado com minha rotina chilena: acordar e ver a cordilheira da minha janela. Tomar café falando em português, espanhol ou às vezes em inglês. Caminhar pela Matucana e fazer carinho no gato da casa 70. Jogar vôlei na quadra da U. Almoçar com os amigos no casino. Correr pela tarde no parque Quinta Normal. Me divertir em Bellavista ou no quarto 301. Fazer festas na cozinha. Às vezes estudar e escrever informes surreais para as aulas de Historia de la Cultura.
Tudo isso fez a despedida doer: o que será de minha vida sem o Chile? Essa dúvida, que não era só minha e também de outros amigos que fiz lá fora, faz você sentir aquele frio na barriga, que me acompanhou até o embarque no avião. E enquanto tentava esquecer um pouco disso resolvi ficar ao máximo perto de meus amigos.
A última noite chegou, e com ela muita alegria e muita tristeza. Alegria por voltar para casa e poder ver meus amados no Brasil. Por haver tido a oportunidade de morar fora. Por ter conhecido lugares e pessoas incríveis. E tristeza por ter que deixar isso para trás.
Às 4h30 de domingo fomos ao aeroporto, e no táxi vi pela última vez Santiago, cidade que tanto amei. Fui me despedindo em silêncio dos lugares por onde passava, esperando um dia voltar para revê-los.
Então, em um momento, pensei: “Mas o que vou deixar para trás? Nada ficará para trás, tudo vai comigo.” Como me disse um amigo horas antes de eu embarcar, “los recuerdos de Chile guardalos dentro de tu corazón”. E foi o que resolvi fazer.
Após um abraço caloroso em cada amigo que fiz, embarquei para o Brasil. E por fim viajei feliz, e satisfeita por tudo que vivi do outro lado da Cordilheira. O Chile agora vive em meu coração, e cada vez que a saudade bate penso “que bom que tive a oportunidade de estar lá”. Como diria Neruda, o grande poeta chileno, “confieso que he vivido”.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Enfim, a despedida

É. Após quatro meses e nove dias em solo chileno, chegou a hora de voltarmos para casa. Eu, sinceramente, estava triste por este momento especial da minha vida estar chegando ao fim. Foram dias inesquecíveis, cheios de novas amizades, lugares e experiências. Pessoalmente, o Chile mudou algumas coisas em mim. Posso dizer que "dar um tempo" na rotina abre a nossa mente, nem que seja um pouquinho. Em terra chilena eu me sentia em casa, apesar das diferenças todas que mencionamos nesse blog. Confesso que apesar do acolhimento, sempre relutei um pouco em aceitar alguns habitos de lá e - o que muito me surpreendeu - alegava que a maneira brasileira de fazer certas coisas era a melhor. Talvez em território estrangeiro a gente tenha necessidade de ser mais patriotas para afirmar nossas raízes - apesar de que em casa possamos viver reclamando de tudo.
Agora vamos aos acontecimentos do 'adiós':
Chegamos de La Serena de ônibus sexta-feira pela manhã. Fomos para El Punto descansar e, logo após desfazer as malas da curta viagem, dar início ao tão temível momento: organizar a bagagem pro Brasil. Na vinda, por sorte, não sei, nossas malas não foram pesadas, mas a minha bolsa veio no limite dos 23kg permitidos em voos na América Latina. Após me abastecer com material da universidade, litros de vinho e algumas outras lembrancinhas para amigos brasileiros, eu e Lary sabíamos que teríamos excesso de peso na bagagem. Para evitar pagar os 60 dólares para quem ultrapassa a cota em até 10kg, fizemos o seguinte: colocamos todo o possível na bagagem de mão, que permite até 8kg. Porém, no momento do embarque não as apresentamos para a pesagem e passamos ilesas de uma possível cobrança. A minha mala chegou aos 21kg, só não pesou mais por falta de espaço, enquanto a da Lary alcançou quase 30kg e não escapou da taxação... Mas o conteúdo fez valer a pena: vinhos, pisco, chocolate.
Na tarde da sexta fomos à USACH buscar os documentos necessários para a validação do intercâmbio na UFSC e vimos pela primeira - a última - vez o edifício do Jornalismo já recuperado do terremoto de fevereiro passado. Passamos o semestre entrando no prédio por uma passagem improvisada ao fundo e dividindo nossa audição entre as aulas e os barulho das obras. Me deu pena só conhecer o 'verdadeiro' prédio da nossa faculdade no nosso último dia lá. Antes dos trâmites burocráticos, nos despedimos do 'casino', o restaurante universitário onde comíamos com nossos amigos chilenos e intercambistas. Tiramos foto do momento, é claro.
À noite, aproveitamos a corriqueira festa de sextas na universidade e fizemos uma 'despedida'. Claro que 99% dos nossos amigos presentes estariam na festa do dia seguinte en El Punto, na véspera da nossa viagem.
Sábado foi o dia de terminar as malas - ou melhor, socar todo o possível para dentro das bolsas. Usamos uma balança velha (com um índice de 3kg de diferença para mais ou para menos) encontrada por amigos na nossa residência para tentar controlar o peso da bagagem. No final da tarde terminei a tarefa e tentei descansar um pouco para a festa da noite. Já que o voo meu, da Lary, Diego Outro, meu pai, Luna e Giuliano eram entre às 7h e às 8h da manhã, resolvemos que 'pasaríamos de largo' a noite, ou seja, não dormiríamos, somente festaríamos. E assim foi. Muitos amigos da Engenharia Elétrica (curso do Giu e do Maicon) estavam em nossa casa para a despedida. Teve churrasco, muita bebida e, é claro, muitos abraços e choradeira. "Me acuerdo del día en que nos conocimos..." "Cómo vuela el tiempo!" "Te echaré de menos." estavam entre as 'top frases' da noite. Apesar do clima de alegria e tristeza, não chorei em momento algum. Talvez pela ansiedade de chegar logo em casa e rever meus amigos, família e namorado, talvez por saber que tudo tem seu tempo. Não fiz drama, apenas aproveitei com meus amigos aquele momento.
A Luna e o pai chegaram de La Serena 1h da manhã, apenas a da nossa ida ao aeroporto! Por sorte, eu e Lary não topamos voltar com eles, e pudemos fazer nossas malas com tempo e nos despedir de nossos amigos. O adiós ao tiu Domingo foi emocionante. Ao deixá-los em El Punto e ouvir nossos agradecimentos por todo o seu cuidado com a gente nesses meses, apenas se virou chorando e foi para o carro. Chilenos...
Tentei descansar por meia hora antes de começar a preparação para partirmos. Às 4h30 subimos num taxi que eu havia reservado e fomos ao aeroporto. O Giu estava triste, mas uma surpresa o fez ficar feliz: alguns de nossos amigos foram ao aeroporto levar uma câmera que ele esqueceu. E eu pude aproveitar para me despedir daqueles que não tive tempo quando saímos da residência. Poucos minutos antes do embarque dei tchau para o Giu na sala de espera da LAN.
O pai e a Luna foram num voo antes do nosso para São Paulo. Nos encontramos em Garulhos às 13h, de onde Luna foi de taxi para casa e nós aguardamos conexão para Floripa às 16h. O voo foi rápido e nele matei a saudade de algo: cerveja gelada. Não tivemos duvidas quando a comissária de bordo perguntou o que queríamos beber. O que me chocou ao descer em Floripa foi o calor. O calor e a umidade. O ar aqui é pesado, passei dias com dificuldade para respirar até me acostumar novamente. De todas as despedidas a mais triste foi a do Outro. Afinal, foram meses de 'convivência forçada', como ele mesmo dizia. Nossos namorados nos esperaram no aeroporto com flores e o Diego atendeu meu primeiro desejo de recém-chegada: uma passada pela beira-mar. No litoral o sol descia na terra, e não no mar. Eu estava em casa novamente.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Viagem a La Serena!

Apenas um dia depois de desembarcarmos em Santiago, eu, Lary e Diego Outro fomos de ônibus rumo a La Serena, uma praia na IV região chilena, ao norte. A viagem durou oito horas e logo após deixarmos nossas coisas no hostel Jofre (aliás, super-indicado para quem planejar ir para lá, nota 10) partimos diretamente para a praia. Há meses eu não via uma praia – para mim Viña e Valparaíso não tem muito clima de veraneio – e a emoção de pisar na areia e ver o mar tomou conta de mim! O litoral central tem cerca de 6km de extensão e é muito bonito. O que me surpreendeu foi ver os chilenos tomando banho de sol com roupa em pleno dezembro! Não preciso nem comentar a cara de estranhamento quando no dia seguinte me viram com roupa de praia deitada na areia... Em compensação, o que causou estranhamento aos brasileiros foram as placas de alerta de vias de evacuação para tsunamis... Na manhã do segundo dia fomos a Coquimbo, uma cidade próxima (20 min de ônibus) conhecer a famosa Cruz Del Tercer Milenio que fica sobre um morro. Dentro dela é possível subir de elevador até os seus braços e ver a cidade de cima! Descendo do monumento e indo em direção ao porto da cidade pagamos o equivalente a R$ 8 para fazer um passeio de barco e conhecer a Isla de los Lobos, uma pequena ilha totalmente povoada por lobos marinhos! O recorrido vale muito a pena! No porto há várias tendas e um mercado onde é possível comer bem. Entretanto, meu pai e minha irmã Luna estavam chegando a La Serena, o que impediu nosso almoço à beira mar. Após buscá-los, passeamos pela praia e tomamos cervejas em um bar sobre a areia. Devo destacar que algo me chamou muito a minha atenção neste intercâmbio foi o fato de chilenos tomarem cerveja quente. Bastam poucos minutos de refrigeração e já estão prontas para o consumo – e para espantar qualquer brasileiro bom de copo.

O dia seguinte foi marcado por um belo passeio pela região do Valle de Elqui, terra da Prêmio Nobel Gabriela Mistral e das fábricas de pisco , bebida típica chilena - ou não. Há cerca disputa com os peruanos sobre sua origem. Visitamos a produção de pisco Mistral ­ (nome em homenagem à escritora), um passeio muito interessante e com direito à degustação. O restaurante da fábrica é lindo, é possível beber um delicioso pisco sour e saborear as tradicionais empanadas de pino enquanto admira a bela paisagem do lugar. Pode-se chegar de ônibus em Pisco Elqui, uma viagem de uma hora e meia. De lá é possível voltar passando por pequenas cidades como Vicuña e Mont Grande, onde há museus da Gabriela Mistral, um deles guarda o Prêmio Nobel que ela ganhou em 1945.

Passamos apenas três dias na região de La Serena, mas foi o suficiente para conhecer vários lugares incríveis! Para os viajantes e mochileiros de plantão, fica a dica!

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Rumo ao Atacama!(parte III): Pukará de Quitor e Reserva Los Flamencos

Enfim chegou domingo, nosso último dia ativo no Atacama, pois na segunda cedo voaríamos novamente a Santiago. O primeiro passeio do dia foi proposto pelo nosso pai: uma visita às ruínas de Pukara de Quitor, uma civilização pré-incaica que habitava a região. A proposta, não muito comum entre tantas opções mais conhecidas, veio a ser uma das melhores da viagem: o lugar é encantador.

Eu, Nay, Luna, pai e Domingo demoramos pouco mais de 40 minutos para escalar até o topo do monte onde estavam as ruínas. A vista, óbvio, dava ao Licancabur, quem mais? O passeio, se não me engano, custou 1500 pesos (perto de seis reais) e você pode caminhar livremente pelas ruínas, sem, obviamente, tirar nada do lugar. Claro que não podíamos deixar de transgredir uma das regras e seguramos a placa “Zona de cumbre” para tirarmos fotos. Coisas que fazem parte da viagem se você está com o Dema...
Segunda aventura do dia: ir ao Salar do Atacama conhecer a Reserva de Flamingos na laguna Chaxa. Um espetáculo totalmente diferente de tudo.
Chegamos de carro, como sempre, no meio do nada: somente areia e sal – afinal, estamos em um salar – para todos os lados, e nada mais. Ao descer do carro há uma pequena casinha onde são vendidas as entradas da reserva, e atrás dela se esconde a laguna. É necessário caminhar na aridez do deserto por uns 10 minutos – e, no nosso caso, bem embaixo do sol de meio-dia – até avistar os flamingos dentro d’água. As aves ficam o tempo todo com a cabeça baixa, procurando comida nas águas salgadas. Às vezes uma ou outra resolvem levantar voo bem em cima da cabeça dos turistas, que, óbvio, não param de tirar fotos. Além da laguna e dos flamingos não existe nada além de areia e sal. Até o horizonte.
Fui caminhar com a Luna pela reserva enquanto o pai ficava deitado na beira da laguna e a Nay também, em outro canto. Quando voltamos ela nos disse que passou ali por uma das experiências mais incríveis de sua vida: ficar em silêncio e ouvir absolutamente nada. Ela disse que ficou meia hora com a boca fechada para ver, pela primeira vez, como é ouvir o silêncio total. Em dado momento ouviu um zumbido forte, e acreditem, era o bater de asas de uma mosca. O Atacama proporciona experiências únicas.
Pela tarde, após voltarmos a San Pedro, resolvemos ir ao Pozo Tres, uma piscina pública da cidade, onde o pai havia ido uma vez há mais de 20 anos. Claro que eu, Nay e Domingo, peritos em participar de roubadas, fomos com ele.
O lugar, segundo o pai, mudou completamente: construíram uma parede que bloqueava a vista ao Licancabur (isso foi uma novidade para mim, pois o vulcão sempre é visto de qualquer lugar) e estava cheio de pessoas. “Quando eu vim era só eu e minha esposa”, disse. Bom, apesar das mudanças ele e Domingo resolveram cair na piscina enquanto eu e Nay tomávamos banho de sol.
Duas horas depois, quando resolvemos ir embora, vieram o pai e o Domingo rindo em nossa direção. “Vocês não viram nada?”, nos perguntaram. Após dizermos que não com uma cara de desentendidas eles explicaram: “O salva-vidas da piscina, após verem vocês entrarem, saiu correndo para buscar aparelhos de peso e passou a última hora inteira perto de vocês, fazendo exercícios. Se alguém se afogasse ele nem ia notar.” E o pior: nós nem reparamos! O coitado deve ter ido para casa com dor nos braços e inconsolado: sequer reparamos sua presença.
À noite, para nos despedirmos bem do deserto, compramos cervejas, vinho e piscos para o último jantar no hostal. O pai e o Domingo assaram frango, e ficaram a noite toda fazendo a piada “Alguém quer carne de flamingo?” para os outros hóspedes. Um jovem alemão, o Matthias, sentou para comer conosco. Já havíamos conversado com ele em outras noites, ele é uma pessoa bacana e, como todo bom alemão, forte para o álcool.
Após o jantar pai e Domingo foram dormir enquanto que eu, Nay e Luna continuamos bebendo com nosso amigo. Na madrugada seguinte, às 4h, ele sairia para fazer o passeio dos gêiseres, e por essa razão nos propôs beber até a hora de seu passeio. Aceitamos. Ficamos entre garrafas de pisco e de cervejas – quentes, como toda boa cerveja chilena – bebendo e conversando. A noite no deserto é fria, de modo que estávamos todos encasacados. Ficamos até as 3h40 juntos em uma mesa no jardim do hostal, até que Matthias resolveu ir organizar suas coisas para o passeio que começaria em 20 minutos. Nós, mortas de cansaço, fomos dormir.
No dia seguinte, às 8h, tivemos que acordar para irmos a Calama, onde embarcamos de volta a Santiago. O voo dessa vez foi tranquilo, tirando a parte da aterrissagem, quando as rodas do avião fizeram um barulho enorme e as luzes de emergência ascenderam. “Acho que as rodas caíram”, disse o Domingo, rindo do pânico que provocou nas brasileiras. Mas chegamos bem, graças a Deus.
Em Santiago novamente tivemos apenas um dia para organizar a próxima viagem: La Serena, que começaria no dia seguinte pela manhã. Mas isso já é assunto para um outro post.